Rinália é a 1ª Prenda do CTG Lenços Brancos
Em 2001, Gertrudes Rios Moreira, hoje com 51 anos, viveu um verdadeiro dilema. A dona de casa abriu mão do direito de defender a inclusão da filha de 7 anos em uma escola regular em troca de uma educação que acreditou ser a ideal para uma menina com deficiência intelectual. Rinália Moreira dos Santos, de 19 anos, nasceu com deficiência no cérebro causada por um erro médico durante anestesia neonatal. O procedimento foi realizado em Porto Alegre, mas a falha profissional só foi constatada oito meses após o nascimento.
Com 7 anos, Rinália passou a conviver com outras crianças com deficiências intelectual ou física na Escola Especial Nossa Senhora das Graças. A menina ficou 12 anos na instituição. A saída dela, este ano, foi conturbada por incertezas que assombraram a maioria dos pais contrária às exigências do Plano Nacional de Educação (PNE) que prevê a inclusão destes alunos à Rede Pública de Ensino. “Eu sempre relutei em colocar a Rinália numa escola normal. Sempre tive medo dela ser maltratada pelas outras crianças”, disse a mãe.
O tempo acabou mostrando que a decisão de inserir os alunos da Escola Especial em escolas regulares foi acertada. Rinália, em pouco mais de três meses, demonstra avanços consideráveis. Inserida num grupo de alunos da 3ª Série da Escola Municipal Ferraz Neto, a jovem deixou de ser tratada com uma criança e passou a ser vista como aluno. “Ela já aprendeu a somar e a copiar do quadro. Durante 12 anos, na Escola Especial, ela apenas fazia trabalhos de pintura nos cadernos”, avalia Gertrudes.
O desempenho da jovem mostra que os resultados dependem, em boa parte, da visão dos pais em relação à inclusão. Quando o responsável reluta em permitir o acesso da criança especial à convivência com outras da mesma idade, a evolução intelectual também para no tempo. “A Rinália pedia para conviver com outras crianças, mas eu sempre tive medo desta convivência, por causa do preconceito”, comenta.
Curiosamente, no mesmo período que inscreveu a filha na Escola Especial para evitar o contato com crianças ditas “normais”, Gertrudes incluiu a menina na Invernada Artística do CTG Lenços Brancos do Bom Fim, onde ela passou a conviver com meninos e meninas da mesma idade. Enquanto na escola ela estagnou, no CTG a prendinha evoluiu com o passar dos anos. Hoje, ela é a 2ª Prenda Adulta da entidade.
“Naquela época, vi no tradicionalismo, onde existe muita disciplina, mais segurança para a inclusão da minha filha. E realmente ela sempre foi muito bem tratada: todos trabalhavam, falavam, dançavam e brincavam com ela. Hoje, no colégio é a mesma coisa”, explica. Rinália é integrante de um grupo de 27 alunos da Escola Especial, anterior à inclusão. Assim como ela, outras crianças e jovens foram matriculados na rede regular e passam por um processo de adaptação que inclui, além de salas de recursos, o acompanhamento individual de um monitor.
As atividades extraclasses acontecem nas terças-feiras e sextas-feiras, em horário inverso, na sala de recursos da Escola Municipal Ferraz Neto com aplicação de oficinas de pintura e trabalhos manuais e utilização de computadores. Pelo Brasil, testemunhos de pais comprovam que a inclusão é um processo necessário na vida da criança ou jovem com deficiências intelectual ou física. O Portal Terra divulgou no final de outubro reportagem com Margarida Seabra, uma das pioneiras na defesa da inclusão.
No começo da década de 80, ela precisou travar uma verdadeira batalha para mostrar que a sua filha merecia ser tratada de maneira igual a todas as outras crianças da sua idade. Débora, hoje com 32 anos, é a primeira professora com Síndrome de Down do Brasil e uma das maiores defensoras da inclusão de todas as crianças com deficiência intelectual na escola regular.
O Ministério da Educação (MEC) é a favor da inclusão de todas as crianças entre 4 e 17 anos na escola regular, independente do grau de deficiência intelectual. Em nota, a pasta disse que esses alunos precisam de acompanhamento especial diferenciado no contraturno, o que pode ser oferecido em salas de recursos instaladas nas próprias escolas ou em centros especiais, como as Apaes.
Médico geneticista e um dos maiores especialistas do Brasil em Síndrome de Down, Zan Mustacchi afirma que a principal característica das pessoas com Down é o comprometimento intelectual, que pode variar de um para outro de acordo com as condições genéticas e, principalmente, ambientais. Para ele, as crianças precisam ser estimuladas desde o seu nascimento. "Elas apresentam grande dificuldade de habilidade cognitiva, não conseguem aprender coisas abstratas. As crianças com Down aprendem vendo, as pessoas comuns aprendem ouvindo".
Débora Seabra, que sempre estudou na escola regular e hoje participa de eventos no Brasil e no exterior defendendo a inclusão das crianças com Down, conta que já passou por situação de preconceito durante o ensino fundamental e até no curso de magistério, mas que sempre gostou de conviver com pessoas diferentes.
Embora nos últimos tempos a inclusão de crianças com Down na escola tenha aumentado significativamente, os números ainda estão longe da meta do governo de universalizar o atendimento em 10 anos. De acordo com o Censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2010, 37% das crianças com deficiência intelectual estavam fora da escola, percentual bem superior à média nacional dos alunos sem Down, que é de apenas 4,2%.
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