segunda-feira, 18 de fevereiro de 2013

Os fetiches capitalistas


Fetiche é um conceito que tem origem na crítica sobre as religiões primitivas. Hoje os filósofos e sociólogos se referem a um estado social em que a sociedade não tem consciência de si mesma. A maioria dos linguistas caracterizam fetiche como a adoração a um objeto ou pessoa.

E uma das constatações mais evidentes é a de que o fetichismo e a alienação mantém entre si relações muito íntimas. E nesse processo há uma supervalorização de indivíduos em detrimento de outros, onde os seres sociais são governados por objetos materiais ou indivíduos mercadorias. Outra constatação que os especialistas tem referido é a de que o processo de desalienação não só é dificultado pela supremacia do mercado, mas também por nosso subconsciente, que se mostra, neste caso, extremamente impulsivo.
Ao longo do século vinte, três fetiches foram consolidados na nossa sociedade de consumo: o ator, a modelo e o jogador de futebol. Este último se insere no cenário de consumo na segunda metade do século. Um marco desse acontecimento é o surgimento do jogador Pelé.
O culto a essas personalidades, manipuladas pelo mercado, com uma dose substancial de espetacularização, explica em parte, a religiosidade e a cordialidade do povo brasileiro, bem como o sucesso do caudilhismo e das ditaduras na América Latina. E a mercadoria/homem emerge desse espetáculo, que tem como ingrediente de massa a alienação.
A novela Salvador da Pátria, por exemplo, é fruto desse culto à personalidade e deriva para a mídia dessa cultura de consumo do homem/mercadoria. 
Tanto a modelo, o jogador de futebol, e boa parte dos atores, patrocinam um mundo do faz-de-conta adorado pelas pessoas. É bem verdade que o cinema tem uma produção artística e cultural muito interessante, valiosa para a sociedade, mas é significativa a parcela que só serve para o mercado e auxilia no processo de alienação coletiva. O futebol, por sua vez, foi um esporte inserido culturalmente em boa parte da humanidade, servindo de integração para os jovens. Mas hoje é literalmente absorvido pelo mercado e o jogador abandona o ser social esportista para transformar-se numa mercadoria valiosa. Restou o futebol amador e o saudável exercício de grupos sociais onde os indivíduos se identificam entre si.
Esses fetiches distraem o público e patrocinam grandes lucros para o mercado e para novos ricos refestelados nesse mundo de distrações vazias. Com a modelo, o público alimenta ilusões de consumo alienantes e auxilia a consolidar valores de uma sociedade desigual.  O futebol tornou-se uma ilusão extremamente massificada. 
E nesse diapasão, a sociedade investe em atitudes de incrível hipocrisia. Existe na Argentina uma igreja Maradoniana, com símbolo, sede e toda a característica de uma seita. Tom Cruise é vice-líder de uma seita intitulada Cientologia. Em ato de puro narcisismo, foi homenageado por ela, e seus adeptos acreditam que ele seja um Deus vivo. Inacreditavelmente, Gisele Bundchen foi homenageada pela Universidade de Harvard, considerada um centro de excelência na educação superior norte-americana.
O jogador Neymar recebeu o título de cidadão paulistano, comenda destinada a pessoas que deram contribuições importantes para a sociedade. Mais surpreendente foi a medalha Machado de Assis que a Academia Brasileira de Letras  deu ao jogador Ronaldinho Gaúcho e ao técnico Vanderlei Luxemburgo. Que contribuição social ou literária esses cidadãos deram ao povo brasileiro? Nenhuma. A adoração por eles e por outros “deuses do mercado” é produto do fetichismo produzido pela ilusão e paixão inúteis e pela alienação assustadora reproduzida por uma sociedade de consumo desumanizada.  


Luiz Augusto Rodrigues
Advogado
  luizaugustorp@hotmail.com

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